domingo, 16 de junho de 2013

Sequência Didática: Lendas Urbanas


Versão do Aluno

O Homem do Saco

Essa história aconteceu há mais de vinte anos, num dia nublado. Perfeito para Josué, Mateus, Antonia e Frederico começarem o dia colocando o plano combinado em ação. Estavam de férias, e o plano principal seria desvendar o mistério do desaparecimento do Carlinhos, um menino que morava na mesma rua que eles.
No dia do sumiço, Josué, Mateus, Antonia e Frederico se encontraram para brincar, mas quando chegaram na esquina da rua levaram o maior susto.
A polícia estava lá, e a mãe do Carlinhos chorava sem parar. Os adultos se aglomeravam na porta da casa, mas não deixavam nenhuma criança chegar perto nem explicavam nada.
A única pessoa que deu alguma explicação para as crianças foi Dona Joana, a moradora mais antiga das redondezas.
— O Homem do Saco pegou o Carlinhos. Eu já expliquei bem quem ele é, não expliquei? Um velho que anda com um saco nas costas para roubar crianças desobedientes e que andam sozinhas. Se vocês não quiserem sumir também, é melhor obedecerem bem aos seus pais, entenderam?
Meninos e meninas entenderam bem. Uns acreditaram, outros choraram com medo, outros fizeram pouco caso e acharam que era conversa fiada da Dona Joana para ninguém fazer bagunça na rua durante as férias. O fato é que, verdade ou mentira, desde aquele dia um mistério começou a rondar a Rua das Andorinhas e tudo ficou diferente. As crianças não brincavam mais tão à vontade quanto antes e não falavam outra coisa a não ser no medo que tinham de o Homem do Saco aparecer e levar mais alguém.
No dia em que os quatro amigos se encontraram para colocar o plano em ação, estavam dispostos a explorar as redondezas para achar alguma pista sobre o sumiço do Carlinhos, já que os pais evitavam falar qualquer coisa sobre o assunto. Eles já tinham escarafunchado um buraco que havia no final da Rua Cinco, espionado o quitandeiro, que achavam que era um homem muito esquisito, e estavam voltando para a Rua das Andorinhas quando viram um homem misterioso mexendo num saco de lixo bem perto da casa do Carlinhos. Levaram um susto quando se deram conta de que era um velho barbudo, sujo, e que carregava um enorme saco nas mãos. Os quatro gelaram. Só podia ser o Homem do saco. Justo nessa hora, Antonia e Josué ouviram um choro vindo do saco. Frederico disse que devia ser imaginação. Ele era o que menos acreditava nessa história, preferia pensar que o Homem do Saco não passava de uma lenda. Mas mesmo assim não tinha muita certeza.
Os quatro foram se esgueirando e chegaram mais perto. Ficaram escondidos atrás de uma caminhonete estacionada do outro lado da rua.
De repente, o pavor tomou contados amigos. Desta vez, todos ouviram um choro fininho vindo da direção do saco.
E na mesma hora viram o velho abrir o saco que trazia nas mãos e remexer no saco de lixo. Mas justo quando iam ver o que o ele faria, um caminhão enorme passou e tapou a visão.
E quando o caminhão saiu, a única coisa que viram foi o Homem do Saco dobrando a esquina com seu saco nas costas. Engraçado é que todos acharam que o saco do velho parecia mais leve.
Em seguida, os quatro correram na direção do saco de lixo e o que viram não foi nada bom. Josué, Mateus e Antonia ficaram de boca aberta.
— Nossa, gente! São ossos – disse Mateus.
— Ossos e restos de comida!!! – disse Josué espantado.
— Aposto que são os ossos do Carlinhos que aquele velho malvado deixou aqui pra todo mundo ter certeza de que ele não vai mais voltar.
—Não fala besteira, Antonia. Esses ossos devem ser restos do açougue da esquina. Se fossem do Carlinhos, alguém teria feito alguma coisa.
— Que coisa, Frederico, você nunca acredita nas provas que a gente encontra. Que coisa chata!
— Não é isso, Mateus, mas pensa só, tinha um monte de gente na rua e ninguém pegou o Velho do Saco. Por quê?
— Sei lá por quê. Os adultos são sempre esquisitos. O que sei é que teremos que desvendar mais este mistério.
Acontece que, duas semanas depois, a mãe do Carlinhos se mudou e nunca mais ninguém teve notícias dela nem do filho. Até hoje Josué, Mateus, Antônia e Frederico se perguntam de quem eram aqueles ossos. Mas como nunca descobriram nada, começaram a espalhar essa história de Velho do Saco e ossos de menino.
Foi assim que a história do Carlinhos virou lenda.
http://revistaescola.abril.com.br/pdf/homem_do_Saco.pdf

Entendendo o texto
Quando eu tinha dezessete anos, comecei a ler histórias de terror. Conheço todos os grandes mestres do suspense: Edgar Allan Poe é meu preferido. Em segundo lugar está Bram Stoker, criador de Drácula.
Depois da leitura atenta do texto, responda:
1) Quem é o narrador da história?
2) Quais os personagens da história?
3) Onde se passa a história? Em que tempo ela ocorre?
4) Na sua opinião, o que aconteceu com Carlinhos?


Produção de Texto


A Loira do Banheiro - Heloísa Prieto

Região: Avaré, São Paulo
Informante: Lauro da Cruz Correa
Idade: 36 anos
Profissão: Divulgador Editorial


Na vida, tenho duas grandes paixões: literatura e cinema. Quando era menino, eu queria ser ator, trabalhar em filmes de aventuras, fazer papel de astronauta, de soldado, tudo que envolvesse muito perigo.Mas eu nasci no interior de São Paulo. Difícil realizar um sonho desses.
Durante vários anos vivi todas as emoções mais intensas, o medo, o amor, o perigo, lendo livros ou sentado no cantinho escuro de um cinema.
Sou um cara de sorte. Trabalho com aquilo que mais gosto: livros. Atuo como divulgador de uma grande editora. Percorro as escolas mostrando os lançamentos, contando as histórias, enfim, sou pago para ler, veja só.
E sempre que eu tentava vender uma boa história de fantasmas, depois fechava o livro aliviado e comentava com os professores: escritores têm tanta imaginação... Já pensou se tudo isso fosse verdade? Até o dia em que descobri que o mistério nos ronda, nos assombra, também fora dos livros e dos filmes.
E se os fantasmas existirem? Afinal, há histórias assim no mundo todo...
Essa dúvida me persegue e tudo começou por causa de uma história que me foi contada por três garotos apavorados. Eu caminhava pelos corredores de uma escola levando meus livros, minha maleta com os catálogos editoriais, os braços repletos de panfletos anunciando os lançamentos. Vi a porta do banheiro masculino abrir-se com toda violência. Dela saíram três jovens de mais ou menos dezessete anos de idade. Cabelos molhados, respiração ofegante, o rosto em pânico. Aquilo despertou minha curiosidade.
Na saída da escola, encontrei um deles, Ricardo era seu nome. Normalmente sou muito discreto, mas a curiosidade me matava.
—Vem cá, me conte, por que foi que vocês saíram correndo daquele jeito? Viram alguma assombração?
Ele custou um tempo para responder. Mas de repente disse bem baixinho:
— Mas eu vi mesmo, eu vi um fantasma.
— Que fantasma, garoto? Você está passando bem? Quer que eu chame sua professora?
—Não, escuta, eu só vou contar pro senhor, depois eu quero esquecer.
—Então conte, mas é melhor sair daqui, do meio do corredor.
Fomos até o pátio, o garoto respirou fundo e começou a me contar:
—Bom, o negócio começou assim: eu tenho mais dois amigos. Eu sou o Rico, depois vem o Betão. O Betão é cético. Ele tem que ver para crer. Só que ele nunca vê nada. Aliás, ele vê sim. Garotas. O cara é magrinho, tropeça em tudo, mas faz o maior sucesso. Dá raiva, até. Bom, tem também o João. Ele ri muito, é o contrário do Beto, acredita em tudo que se fala. Chupa-cabra, ET de Varginha, Loira do Banheiro e daí vai.
—E você? É cético ou crédulo? — perguntei, achando engraçado o jeito do menino.
—Eu? Nem tanto ao mar, nem tanto à terra, como dizia minha avó. Eu acredito e não acredito. Não vou dizer que preciso ver para crer, porque dá de ver...
— E você já viu alguma coisa estranha, certo? — sugeri.
—Certo. Foi assim: nós três estávamos no banheiro falando das meninas. O único de nós que já teve namorada foi o Beto, claro. O João estava sentado no chão. E eu estava louco da vida. Tinha levado um fora de uma garota. Foi então que tive uma ideia. Era maligna, agora eu sei. Até hoje me arrependo. Mas quando vi, já tinha falado “E se a gente chamasse a tal da Loira do Banheiro?” O senhor já ouviu falar?
—Não — respondi, achando aquela conversa engraçada.
—É uma loira fantasma. Ela aparece para quem invoca seu nome.
—Vai me dizer que ela apareceu para vocês — eu disse incrédulo.
—Bem, nós fizemos tudo que era preciso: bater três vezes no espelho, falando bem baixo, com voz de apaixonado o, loira, loira, loira, depois a gente deu descarga três vezes e três pulinhos ridículos. Mas eu estava tão bravo naquele dia... resolvi fazer palhaçada, pensava que era só brincadeira.


Mas não era, não.
Lembro de tudo até hoje.
Corri para o espelho.
Beijei minha boca.
Sussurrei: loira, loirinha, vem cá...
Meus amigos morriam de rir.
Fizeram igual.
Depois, todos nós demos três descargas.
Ríamos tanto que a barriga doía.
Depois demos os três pulinhos.
Foi nisso que apareceu o diretor.
Resultado: suspensão para todos nós.
Na volta para casa, meus amigos estavam muito bravos comigo.
De repente, eu vi. Uma loira linda. Atravessando a rua.
—A loira! — gritei.
—Você está louco? Essa loira é gente, não é fantasma coisa nenhuma! —o João falou.
Do outro lado da calçada, a loira caminhava, sorria e acenava de longe. Quase desmaiei. Só não desmaiei porque apareceu outra loira. É isso mesmo. Eu ia gritar, mas aí surgiu a última loira. Idêntica.
Loiras trigêmeas. Uma para cada um de nós.
Bom, atravessamos a rua feito loucos. As loiras nos acenavam do outro lado. Nem vimos os carros, nem ouvimos a buzina, nem o ruído do breque.
Quando acordamos, estávamos no hospital. Uma maca ao lado da outra. Todos nós machucados, braços, perna na tipoia.
De repente, Betão estendeu a mão para o espelho do quarto do hospital e gritou assim:
- Olha lá as loiras!
Eu olhei. Antes não tivesse olhado.
As trigêmeas. Lindas. Idênticas. Uma para cada um de nós.
Sabe onde?
Dentro do espelho.
Acenando adeus. Rindo.
Desmaiamos outra vez.
É por isso que nunca vamos ao banheiro sozinhos, de jeito nenhum. E se ela aparecer?
Depois, era só entregar o caminhão. Eu tinha combinado que voltava de ônibus pra São Paulo. Ainda bem. Depois daquela noite, fiquei uns trinta dias sem dirigir. O medo me matava.

Quando o menino acabou sua história, levantou-se e foi embora rapidamente.
Fiquei pensando, essa história dava um bom conto de terror, a garotada inventa cada coisa para acabar com o tédio... Loira do Banheiro!
Mas naquela noite, sonhei com lindas loiras fantasmagóricas, dançando nos reflexos dos espelhos, na tela da televisão... Acordei pensando que aquilo já estava virando um exagero. Afinal, era só um desses casos malucos, bobagem de criança. Acontece que, daquele dia em diante, cada vez que entro no banheiro de uma escola, lembro-me da Loira Fantasma.
Confesso que, ao longo do tempo, encontrei várias outras crianças assustadas com essa mesma assombração. Parece epidemia. Um medo que contagia. É, porque aos poucos, vou ser sincero, eu também comecei a sentir medo. Mesmo sendo um adulto, mesmo conhecendo tantas histórias e tantos filmes de terror, há dias em que entro no banheiro bem rápido, lavo as mãos sem olhar para o espelho e, quando fecho a porta, respiro bem aliviado.
E se for tudo verdade? E se os fantasmas existirem? Como é que ficam os vivos?
Uma coisa eu sei. Depois da Loira, todas as outras histórias viraram bobagem, invenção de escritor.
(Heloísa Prieto. A Loira do Banheiro e outras histórias. São Paulo: Ática, 2007. p. 27-32.)


A partir da leitura da lenda urbana “A Loira do Banheiro”, de Heloísa Prieto, produza uma lenda urbana.
Pense em histórias de mistérios que envolvem cenas cotidianas. Lembre-se que seu texto será publicado no blog da escola. Dê um título ao seu texto.




Contextualizando a Lenda Urbana Vovó Maria
Leia o texto abaixo:

Vovó Maria
Região: Dracena, São Paulo
Informante: João da Cruz Cordeiro
Idade: 54 anos
Profissão: caminhoneiro aposentado


Juro de dedo cruzado. Pode acreditar. Aconteceu de verdade. Foi numa noite fria pra danar. Eu tinha parado num bar para tomar um copo de café. Já passava das onze. Eu estava bem chumbado. Mas não queria dormir. Precisava chegar em Dracena, só faltavam uns cem quilômetros pra Junqueirópolis, a última cidade.
Sabe como é, mesmo pra quem está acostumado, às vezes, o medo bate forte. Tem dia, quer dizer, tem noite que não dá não. A estrada estava vazia. De vez em quando eu via um bicho, morcego, cachorro, passando na frente do caminhão. Liguei o rádio, cantei um pouco. Deu sono. Medo e sono, não tem coisa pior. Eu tinha um pressentimento...
De repente, vi um sujeito pedindo carona.
Gente na estrada, assim à noite, é perigo na certa. Mas quando bati o farol na cara dele, vi que era só um estudante. Um garotão. Parei e abri a porta. É bom ter com quem conversar:
- Pra onde você vai? – perguntei.
- Estou indo pra Sorocaba; minha família é de lá.
- E por que está pedindo carona?
- Eu vinha de ônibus. Deu pane no motor. Os caras estão lá atrás parados.
“Que estranho”, pensei eu, “será que eu tinha dormido na estrada?” Em todo caso, fiquei quieto. O menino continuou.
- Amanhã eu tenho que fazer uma entrevista. Não posso arriscar.
- Entrevista pra quê?
- Pra fazer um estágio numa fazenda – ele respondeu. – Eu estudo agronomia.
Fiquei satisfeito. O rapaz era boa pessoa. Assim meu sono passava, o medo então, bom, esse eu já tinha sumido. Ai se eu soubesse...
Bom, lá pelas tantas, quando a estrada estava completamente vazia, breu pra tudo quanto é lado, não é que o menino me pergunta assim:
- O senhor já ouviu falar da Vovó Maria?
- Como é que é?
- A Vovó Maria, a velha feiticeira.
- Cruz-credo, menino, o que é isso?
- É um fantasma das estradas.
- Ah, sai pra lá, eu não gosto dessas coisas, não.
- Me contaram que ela era uma velha danada de ruim. Fez tanto feitiço, tanta maldade, que quando morreu virou alma penada. Que ela anda pelas estradas assustando caminhoneiro.
- Tá louco, sô, para com isso – eu disse.
- Mas juro que é verdade! Já morreu muita gente por causa da velha. Ela é louca pra fazer mais crueldade.
Eu já estava ficando bravo com o menino.
- Escuta aqui, ô garoto, ou você cala já essa boca, ou vou ter que parar o caminhão e mandar você de volta pra estrada.
O menino se assustou. Minha cara estava toda suada. Ele concordou:
- Tudo bem, tio, tudo bem, eu não fiz por mal.
Desviei o olho da estrada por um minuto pra ver se o moleque estava sendo sincero comigo.
Pronto.
Bastou um minuto.
- Tioooooo – o garoto gritou, quer dizer, berrou mesmo, se encolhendo todo, a cara ficando mais branca que farinha, a boca aberta rasgando as bochechas...
Meu cabelo ficou de pé. Inteirinho. Pior que pelo de gato. Porque, quando olhei a estrada – e o pior de tudo é que a gente estava no meio da encruzilhada -, o farol bateu numa velha. Cabelão branco, branco, muito comprido, solto, voando, as mãos erguidas pro céu.
- O que é isso? – gritei.
A velha veio pra cima do caminhão. Abriu a boca. Não tinha nenhum dente. Pisei fundo no acelerador.
Deu cavalo-de-pau.
O caminhão só parou quando entrou no barranco.
Olhei pro menino. Tinha desmaiado. Tomei o pulso. Tava vivo. Graças a Deus.
Olhei pra minha cara no espelho.
Horrível parecia assombração. Será que a gente tinha morrido? Será que eu já tinha passado dessa pra melhor? Belisquei o braço. Doeu. Eu estava vivo. E o caminhão? E a velha?
Respirei fundo.
Contei até dez.
Desci.
Voltei pro caminhão.
As pernas tremiam tanto que eu não conseguia andar.
“Mas você não é macho, sô? Onde já se viu? Tá parecendo mulherzinha?” Se bem que minha mãe é que era macha. Ai se ela me visse daquele jeito...tremendo feito bebê.
Respirei fundo.
Contei até trinta.
Desci.
Consegui andar.
Respirei de novo.
Estou vivo, mesmo.
Examinei o caminho tinha amassado os para-choques. Nada demais.
E a velha?
Ai, meu Deus, e a velha?
E se ela morreu?
E se a velha foi parar embaixo da roda?
Não, na roda, a velha não estava.
E se eu achar a velha morta, estendida no meio da estrada?
Caí no chão. De medo, pernas bambas de novo.
Respirei fundo.
Contei até trinta
Andei até a estrada.
Nada de velha.
- Tioooooooo!
O grito de novo! Fiquei de cabelo em pé. Pior que gato escaldado.
Era o menino.
Tinha acordado.
- Tioooo! Foi a velha! A fantasma! A gente tá morto!
Bom, uma coisa era certa, o menino estava pior que eu!
Quando a gente tem medo, só mais uma coisa resolve: outra pessoa com mais medo ainda. Resolvi ajudar o garoto.
- Calma, calma. Não aconteceu nada, não tinha velha nenhuma, foi só impressão.
- Foi não, tio, eu vi, o senhor viu, ela estava aí, no meio da encruzilhada.
Respirei fundo, aliviado. Dei partida.
- Foi só impressão, meu filho, descanse aí, quando der a gente pára num bar. Você se machucou?
- Não, não, tio, eu estou inteiro.
O menino ficou calado. Os olhos arregalados, colados na estradada. Liguei o rádio.
Ficamos um tempão sem dizer nada. Resolvi puxar uma prosa. Tava com pena do menino.
- Mas que susto, heim, meu filho...
- Tio?
- O que foi, menino?
- O senhor está ouvindo?
- Ouvindo o quê?
- Esse barulho.
- Que barulho é esse?
Tap, tap, tap, tap...
- Parece alguém batendo no vidro, tio.
- Não é nada, menino – respondi e afundei o pé no acelerador.
Tap, tap, tap, tap...
- Tio...
- O que foi, agora?
- Eu acho que o barulho piorou.
- Não tem barulho nenhum – respondi, com medo de olhar no espelho retrovisor.
- Tio...
- Diga aí.
- Eu estou com medo.
- Medo do quê?
- Medo de olhar pra trás.
- Por quê?
- Por causa do barulho.
- Que barulho, nada, você é que é um medroso.
- Então, tio, o senhor olha e me diz.
- Eu não vou olhar, não, eu tenho que ficar de olho na estrada.
- O tio também está com medo.
- Eu não tenho medo de nada.
- Tem não?
- Não.
- Então, vamos olhar.
- Vai, vai, eu olho pelo retrovisor.
- Eu vou virar a cabeça.
Só que nenhum de nós virava. Nenhum de nós tinha coragem pra ver o que é que estava batendo no vidro de trás que dava pra caçamba do caminhão.
- Vamos contar até três – disse o menino.
Comecei:
- Um.
- Dois.
- Três.
- SOCORROOOO!
O negócio era tão feio que ficava difícil descrever.
Era a velha.
Horrível. Desdentada. Desgrenhada.
- Valha-me! Socorro! Alguém me ajude! – ela gritava.
Foi pé na tábua pra valer.
Rezei pra São Cristóvão. O menino só chorava.
- A gente vai morrer, tio, chegou nossa hora, tio.
Eu não dizia nada. O negócio era correr, correr, sem parar, até chegar a algum lugar.
Minhas mãos tremiam, as pernas bambas, o suor escorria feito um rio, meu cabelo já estava tão ensebado que nem arrepiava mais.
O menino se contorcia todo, foi ficando enroscado feito um caracol. Eu já nem ouvia direito o que ele falava. E a velha gritava, gritava, bem nos nossos ouvidos.
Até que vimos uma luz na escuridão.
Um posto de gasolina.
Do lado direito da estrada.
Comecei a rir feito um louco.
O menino então ria tanto que quando a gente estacionou do lado da bomba de gasolina o frentista perguntou assim:
-Vocês beberam? Vieram de alguma festa?
Quando recuperamos o fôlego, eu disse assim:
- Não. Eu só quero um favor. Faça o que eu peço. Eu lhe dou uma ótima gorjeta. Anda.
- Tudo bem - disse o frentista.
- Sobe na caçamba e vê se tem alguma assombração.
- Tá certo, eu subo, mas eu acho que o senhor está variando. Esse negócio está muito esquisito.
Fechei os olhos e fiquei à espera.
O menino voltou a enroscar o corpo.
Tap, tap, tap.
Um frio passou pela minha espinha.
Custei a abrir os olhos.
Mas era só o frentista.
E ele ria. Ria muito.
- O senhor deve estar feliz.
- Como é que é?
- Por causa dela.
Assim que disse essas palavras, o frentista trouxe a velha para perto do vidro da janela.
Minha voz sumiu.
- Ela disse que o senhor salvou a vida dela
- O quê? – perguntou o menino do meu lado.
- Ela disse que estava perdida e que o senhor a encontrou.
- Tá louco, sô! – exclamei. – Eu não quero saber dessa velha, não.
Nisso já estava juntando mais gente em torno do caminhão. Vi que um outro homem foi levando a velha para dentro do bar.
- Eu nem percebi quando ela entrou no caminhão. De onde é que ela veio?
- Não sei, não - disse o frentista. – Mas ela falou que vai estar sempre perto do senhor e desse menino aí.
- Vai nada, vai nada – gritou o menino.
- Sei lá – comentou o frentista olhando para a velha que se sentava para comer -, eu não entendo por que vocês estão com tanto medo. Ela é só uma velhinha, uma coitada.
- E como é que ela se chama, ela disse pra você? – perguntou o garoto
- Vovó Maria – respondeu o frentista – disso eu me lembro muito bem.
O menino e eu trocamos um olhar.
Eu paguei pelo combustível.
Recebi as chaves.
Dei partida.
Pé na tábua.
Pra nunca mais voltar.
E a velha?
Você quer saber?
Eu não.
Não quero nem ouvir falar.

Depois da leitura atenta do texto, responda:

· Quem é o narrador da história?
· Quais são os personagens da história?
· Onde se passa a história?
· Quem é o responsável pela escrita da história?
· A lenda tem início em qual momento dito pelo narrador?
· Qual a profissão do narrador? Qual passagem do texto evidencia isso?
· O personagem acaba conhecendo a lenda “Vovó Maria” de que maneira? Quem conta sobre a lenda para ele?
· Segundo a lenda, o que acontece com as pessoas que encontram a Vovó Maria?
· Os personagens conseguem acalmar os nervos pelo susto ocorrido? Onde eles estacionam? O que ocorre de estranho neste momento?
· Na sua opinião, a história lida ocorreu realmente? Ou nossos personagens estavam assustados diante dos fatos?
· Quem seria a senhora encontrada no final? Relate sua opinião para o desfecho da lenda.


Exercitando...
USO DO VERBO

1- Leia o fragmento do texto “Vovó Maria”.
“Foi numa noite fria pra danar. Eu tinha parado num bar para tomar um copo de café. Já passava das onze. Eu estava bem chumbado. Mas não queria dormir. Precisava chegar em Dracena, só faltavam uns cem quilômetros pra Junqueirópolis, a última cidade”.
a) Localize e destaque os verbos no trecho acima, observe a predominância do tempo verbal “pretérito”.
Qual o efeito de sentido que os verbos provocam na narrativa? Explique.
b) O texto teria o mesmo sentido se predominasse um outro tempo verbal? Explique.


CONCORDÂNCIA NOMINAL E VERBAL

1) Explique as concordâncias nominais e verbais dos fragmentos abaixo:
a) “Pernas bambas de novo”.
b) “O menino se assustou”.
c) “Os olhos arregalados, colados na estrada”.
d) “Minhas mãos tremiam, as pernas bambas, o suor escorria feito um rio, meu cabelo já estava tão ensebado que nem arrepiava mais”.


ACENTUAÇÃO

a) “Caí no chão. De medo. Pernas bambas de novo”
b) “Foi não, tio, eu vi, o senhor viu, ela estava aí, no meio da encruzilhada”.
c) “Foi só impressão, meu filho, descanse aí, quando der a gente pára num bar”.
d) “Tá louco, sô, pára com isso – eu disse”.
e) “O caminhão só parou quando entrou no barranco”


SINÔNIMOS
1- Nos trechos destacados, faça a substituição com os sinônimos adequados para que prevaleça o mesmo sentido.
Exemplo: “Já passava das onze. Eu estava bem chumbado . “Já passava das onze. Eu estava com muito sono”.
a) “Bati o farol na cara dele”.
b) “Meu cabelo ficou de pé”.
c) “O caminhão só parou quando entrou no barranco”.
d) “Tá certo, eu subo, mas eu acho, que o senhor está variando”.


2 – Relacione a primeira coluna com a segunda, identificando qual sinônimo fica mais adequado à frase.
A) “Resolvi puxar uma prosa”.
B) “Respondeu e afundou o pé no acelerador”.
C) “A velha veio para cima do caminhão”.
D) “Quando a estrada estava completamente vazia, breu pra tudo quanto é lado”.
( ) em direção.
( ) acelerei com força.
( ) conversar com ele.
( ) escuridão intensa


ARTICULADORES – CONECTORES
1- Reduza as frases do trecho abaixo, segundo o exemplo:
“A velha veio para cima do caminhão. Abriu a boca. Não tinha nenhum dente. Pisei fundo no acelerador”.
A velha veio para cima do caminhão COM A BOCA ABERTA, SEM nenhum dente. Pisei fundo no acelerador.

a) “Respirei fundo. Contei até trinta. Desci. Consegui andar. Respirei de novo. Estou vivo, mesmo”
b) “Olhei pro menino. Tinha desmaiado. Tomei o pulso. Tava vivo. Graças a Deus”.


2- Localize os conectores dos trechos seguintes, circule-os e explique o sentido que ajudam a construir nas frases:
Exemplo: Eu estava bem chumbado mas não queria dormir.

a) “Eu tinha combinado que voltava de ônibus para SP”.
b) “O rapaz era boa pessoa assim meu sono passava”.
c) “Ou vou ter que parar o caminhão e mandar você de volta pra estrada”.


3- Identifique as marcas de oralidade presentes nas frases abaixo e responda para cada uma delas. Considerando o seu gênero, o linguajar é adequado? Por quê?
a) “Sabe como é, mesmo pra quem está acostumado, às vezes, o medo bate forte”.
b) “Tá louco, sô, pára com isso”.
c) “Escuta aqui, ô garoto”.


COLOCANDO EM PRÁTICA O QUE EU APRENDI

Agora que você discutiu e aprendeu muito sobre a produção das lendas urbanas, reescreva o seu texto colocando em prática tudo o que você aprendeu. Lembre-se: os textos serão postados no blog da escola.

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